ENSAIO ATRÁS DA PORTA

AMIZADE


Lis é atriz e trabalha com Bruno, que é diretor.
Bruno mora sozinho, porém Lis passa boa parte do seu tempo, na casa do amigo.
Os dois ensaiam peças, contam casos, escutam músicas de bolso e revelam segredos.
Bruno é gay, mas pouca gente sabe.
Lis sem dúvida, é sua melhor amiga e Ela sabe de tudo!


CONVÍVIO


Mês passado, assim como ontem, Lis foi até a casa de Bruno, ensaiar e aproveitar pra lhe contar um novo segredo.


[Lis] - Bruno, aconteceu uma coisa diferente comigo hoje e queria te contar.
Bruno olhando atentamente, pediu pra que a amiga continuasse.
- Então, recebi um e-mail, sem nome, nem remetente. Nem sabia que isso era possível. Mas agora tô curiosa!


[Bruno] - O que tava escrito, me conta?


Lis tenta descrever o e-mail, mas nem Ela sabe o que dizer. O e-mail era como uma carta, só que confusa, com palavras mal resolvidas e certamente, explícita e afetuosa.


O E-MAIL


Depois de algumas horas de ensaio e conversas. O assunto do dia ainda era o e-mail desconhecido.
Os dois tentavam argumentar e achar uma explicação.
Começaram a supor quem poderia ser o grande piadista, que deixou Lis tão curiosa.
Claro que não chegaram a nenhuma conclusão, afinal seria precipitado.
Lis mostrou o e-mail a Bruno, que deu muitas risadas e disse:


- Deve ser só mais um fã seu, relaxa!


OS DIAS


Semanas se passaram e Lis continuou a receber e-mails sem nome ou mesmo remetente.
As mensagens não lhe assustavam, pois sempre foram muito atenciosas e demonstravam interesse de quem as escrevia.
Claro que Lis estava a ponto de um infarto, de tanta curiosidade.
Não poderia saber, se era um homem ou uma mulher.
Se era mesmo um fã, ou só mais um desocupado, que lhe 'pegou pra cristo'.
O que Lis desejava mesmo, era cruzar com essa tal pessoa e ter a chance de olhar no fundo de seus olhos e ter certeza de que a conhecia tão bem e vice-versa.


AS RESPOSTAS


Lis começou a responder os e-mails, na esperança de que o contato, revelasse o anonimato por trás daquelas palavras.
Mas parece que só Lis não queria entender, que a graça estava em ser anônimo. Pois quem escrevia para ela, não fazia questão de escrever sobre si.
Ainda assim, Lis não desistiu e passou a respondar cada e-mail, como sendo o último.
Depois de um certo tempo, recebeu sua primeira resposta:


"Olá Lis, como vai?
Imagino e entendo sua curiosidade por conta dos e-mails que costumo lhe enviar.
Saiba que não precisa temer, pelo contrário, faço por prova de minha admiração.
Aprecio seu trabalho, seus escritos, suas fotografias e passei a apreciar sua boa intenção.
Fico feliz em saber, que seus dias corridos, tiverem tempo pra mim.
Jamais cobraria tamanha atenção, mas confesso que até me comovi.
Um dia, provavelmente, e vou torcer que sim, iremos cruzar nossos olhares e vamos sorrir."


BRUNO


Ele está nervoso, preocupado!
Aceitou um trabalho, mas não sabe se irá conseguir criar um roteiro a tempo.
Lis até tenta ajudar, mas Ela sabe que a praia Dela é outra!
Durante alguns goles de café e biscoitos de água e sal, Lis resolve abrir sua caixa de e-mail e está lá, mais um da tal pessoa desconhecida.


"São tantas cores, milhares de olhares parecidos com árvores, mas são detalhes, perto da imensidão que se esconde por trás da porta."


Lis sem entender a mensagem, corre e mostra ao amigo, que diante da tela do computador, reflete.


[Bruno] - Lis, a gente precisa conhecer essa pessoa! Dá um jeito e trás esse tal alguém pra perto, agora!


Os dois passam horas escrevendo um imenso e-mail ao 'Ser Anônimo' e praticamente, imploram sua presença e aparição.


O TEMPO


Desta vez, parece que tudo acabou!
Depois do pedido ensurdecedor dos dois, Lis não tem recebido mais e-mails. Talvez, tenham assustado a pessoa, ou ainda, estragado a magia que há por trás do mistério.
Fato é, os dias parecem estar até mais sem graça pra Lis.
Bruno por sua vez, nem colocou sua ideia em prática.
Mais café, mais biscoitos, agora chá, por ora, doce de leite...
Opa! Um e-mail chegou!
Os amigos correm pra ver de quem é. Sim, é do tal anônimo.


"Não tenho dinheiro, moro longe daí. Gostaria de ir até vocês, mas como poderia?"


Bruno rapidamente, responde o recado, passando seu endereço e pedindo um número de conta bancária, pra que pudesse depositar certa quantia.
Lis acha tudo aquilo muito insano, mas está motivada, feliz e ao mesmo tempo, com receio daquilo tudo.
Mas está feito! Bruno já enviou, agora é só esperar...


A ESPERA


Lis está ansiosa. Já criou histórias, imaginou a imagem da pessoa que pode chegar a qualquer instante.
Bruno quer criar um texto, quer a ajuda de um desconhecido.
Os dois especulam muito. Desejam, ficam temerosos.


A PORTA


Alguém está batendo na porta. Será que já chegou?
Bruno e Lis se olham.
Meio assustado, Bruno vai abrir a porta, mas antes, olha do 'olho mágico' e enxerga um pequeno chapéu e uma mala.
O rapaz se encoraja e abre a porta.
Neste momento, está tudo paralisado.
Lis frente a porta do lado de dentro.
Bruno segurando a fechadura, com medo de olhar pra fora.
Quem está lá fora, está segurando o riso e o choro de tanta emoção.
A porta vai se abrindo de forma vagarosa, é possível ouvir até os corações saltando dos peitos.
Pronto! Está aberta e começa a história...


O ENCONTRO


Sem muito charme, mas muito carinhosa, entra pela porta aquela moça.
Mel, uma jovem educada, inteligente e certamente, corajosa!
Os amigos estão de bocas abertas.
Meio confusos, sorriem e fazem expressões conflituosas.
Mel toda sem graça, não sabe se entra ou se fica na porta.
Lis pede pra que Ela entre, enquanto Bruno desajeitado, ajuda-lhe com a mala.
Minutos silenciosos, desastrosos e quem quebra o gelo é Mel.


MEL


[Mel] - Bom, sei que vocês não devem estar entendendo nada. 
Confesso que a essa altura do campeonato, nem eu estou!
Tudo começou, quando li pequenas cartas, espelhadas por ai, de Lis.
É Lis, talvez você não tenha se dado conta. Mas cada detalhe me inspira e me faz sentir mais viva.
Não é um amor desvairado por você, pessoa física. É uma paixão platônica, pelas coisas que você faz!


Lis e Bruno emocionados, permanecem em silêncio, enquanto Mel continua...


- Agradeço a atenção de vocês e Bruno, em breve irei te pagar.


Depois de mais conversas, Lis resolve ir pra casa e Bruno acompanha Mel até seu novo quarto.


TRABALHOS


Mel é interiorana e aceitou o convite de Bruno pra ir morar na capital, na esperança de conseguir trabalho.
Enquanto a moça não se estabelece na cidade, Bruno resolveu que Ela irá trabalhar com Ele, dessa forma, poderá 'pagar' por sua estadia.
Lis tem um texto novo pra decorar e precisa de ajuda.
Corre pra casa de Bruno, pra pedir que o amigo, improvise ao lado Dela.
O amigo diz que não dá, está cheio de trabalho!
Lis olha pro canto da sala, perto da porta e lá está Mel, sentada, recortando uma revista de moda.


[Lis] - Mel, será que você pode me ajudar a decorar o texto?


Mel olha sem jeito pra Lis e responde que não é atriz!
As duas trocam sorrisos e Lis diz que não tem problema, é só improvisar!
Mel aceita e as duas vão até o quarto, pra não atrapalhar o trabalho de Bruno.


O ENSAIO


Mel entra no quarto e Lis encosta a porta.
Cada uma tem em suas mãos, o roteiro na cena.
A atriz começa a atuar, enquanto Mel meio tímida, espera sua fala.


[Lis] - "Guardo a dor desse amor que você deixou o tempo roubar.
Não espero arrependimento, mas gostaria de atenção.
Você já me olhou Marco? Já me sentiu por dentro?
Viu como sou quente? Ou só me notou angustiada?"


[Mel] - "Se você soubesse quanto vale um amor assim, já teria desistido a muito tempo!"


As duas se olham, Lis demonstra concentração, já Mel está empenhada!


[Lis] - "Marco, escolhi ouvir a chuva chegar e soprar junto ao vento, pra te ter em braços.
Não seja injusto, nem arrogante. Além de amor, é esperança!"


[Mel] - "Talvez as feridas irão se estender, mas torço muito Dulce, pra que essa mágoa morra em você!"


As duas já sentadas ao chão, como manda o roteiro, se olham e esperam mais reação.
O chão gelado é propício, lembrando o teatro.
Precisam criar um casal e um clima pra cena.
Lis interrompe e quer saber de Mel, o motivo que levou a moça a enviar tantos e-mails.
Mel sem esperar tal indagação, responde rápido, dizendo que já explicou a situação.
Lis abaixa a cabeça e no sentido de negação, finge entender.
Mel pede pra que continuem a encenar ou que parem de vez.


[Lis] - "Marco, seja firme e grite ao mundo que desistiu de mim."


[Mel] - "Dulce, quando a última estrela do céu desaparecer, o meu amor por você irá morrer."


Lis segurando fortemente a mão de Mel, se aproxima e como está previsto no roteiro, rouba um beijo longo, daqueles de novela...


O AMOR


Sem entender, com pernas tortas e mãos desconcertadas, as duas seguem pra sala, sem muito falar.
Bruno entende a situação e sai pra comprar café.
As meninas não querem falar sobre o beijo, mas já sentem que é amor.
A admiração que Mel sentia por Lis, era sim um amor físico e muito real.
Lis ao começar a ler os e-mails, já estava se encantando por Mel, sem mesmo saber se era homem ou mulher.
Até então, Lis nunca havia beijado uma garota, a não ser no teatro.
Mel com medo de estragar tudo, se desculpou. Sendo Lis, quem a beijou.


O mundo agora estava confuso e lá fora, as folhas secas caem ao chão...


INFINITO


O que é belo,não precisa ter fim!
É só criar um recomeço e renovar tudo de novo, e de novo... e de novo!
E quando o novo envelhecer, começa de novo!




Kim Walachai

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